segunda-feira, 31 de março de 2014

“A moda está louca para se libertar da roupa”, diz Ronaldo Fraga

Sempre gostei muito do estilista Ronaldo Fraga e cada dia mais fico mais fã dele. Além de ter como forte características as roupas com inspiração na cultura brasileira, ele possui uma identidade única em seus desenhos e suas criações. Uma forte identidade visual em sua marca. E hoje lendo notícias, achei essa entrevista dele e decidi compartilhar com vocês.
Segue a reportagem completa:

"Estilista que desfila na São Paulo Fashion Week fala sobre parcerias fora da passarela, o preconceito que o brasileiro ainda tem com o setor e bate o martelo: “moda é cultura”
O estilista Ronaldo Fraga
Nascido em Belo Horizonte, Minas Gerais, “quarenta e uns anos atrás”, como diz seu blog, o irreverente estilista Ronaldo Fraga diz que nunca almejou a carreira de moda. Entrou sem querer no ramo por saber desenhar, conseguiu um emprego e depois ganhou um concurso que lhe rendeu uma bolsa de estudos em Nova York. A profissão acidental tomou forma em 1996, com a coleção Eu Amo Coração de Galinha, seguida, um ano depois, por Em Nome do Bispo, inspirada no artista sergipano Arthur Bispo do Rosário.

Desde então, é fácil perceber em seus traços a presença constante de elementos da cultura brasileira, inspiração que delineou a marca que leva seu nome e o destacou no metier da moda como um estilista “cult”. Com quase vinte anos de profissão, Fraga já homenageou em seus tecidos os escritores Carlos Drummond de Andrade e Guimarães Rosa, a estilista Zuzu Angel, a cantora Nara leão e até o rio São Francisco. “Só tem uma coisa que me move, que se eu não fosse estilista eu continuaria a perseguir: meu amor pela cultura brasileira”, diz. “Por isso, minha cartilha sempre foi essa, fazer a moda como um vetor cultural.”

Em tempos em que ainda se discute no Brasil se moda é ou não cultura e a indústria têxtil se encontra em crise, face à concorrência desleal de países como a China, o estilista lamenta o descaso do país em valorizar a produção nacional e afirma que, apesar das dificuldades, mantém sua produção em solo nacional. Mesmo que isso custe parte da estrutura de sua empresa, como custou. “Somos resistentes, somos otimistas só de raiva”, afirma.

Figurinha carimbada na São Paulo Fashion Week, que abre sua 37ª edição nesta segunda-feira, Fraga vai desfilar sua coleção de verão 2015 no dia 2 de abril, com o tema Ronaldo Fraga em O Caderno Secreto de Cândido Portinari. A data é de longe a mais badalada da semana de moda paulistana. No mesmo dia desfilam também outros estilistas-estrela, como Fause Haten e Gloria Coelho, e a top model Gisele Bündchen para a grife Colcci.

Confira abaixo a entrevista concedida pelo estilista ao site de VEJA.

Croquis da coleção 'Ronaldo Fraga em O Caderno Secreto de Cândido Portinari'

Por que escolheu Cândido Portinari como inspiração para sua nova coleção? O Portinari inspira de diversas formas. Não só sua obra, mas também a trajetória. Filho de camponeses, ele sai do interior de São Paulo, passa por algumas grandes cidades e em Paris cria sua identidade. Lá ele decide sobre o que vai pintar o resto da vida: o Brasil rural, o povo dele. Ele volta ao Brasil e até o dia de sua morte ele retrata o povo brasileiro, com suas festas e suas mazelas, sempre sob a ótica da infância. Isso é fascinante. E seu trabalho é extremamente têxtil, todo quadro dele tem uma roupa escondida.

Como se deu o processo de pesquisa da obra até a roupa? Quando a inspiração para uma coleção é a literatura tudo fica mais fácil, pois você é o dono da imagem. Mas a obra de Portinari está pronta, construída. Quando comecei a criar pensei: "Por que fui mexer com isso?". Sempre que você olha um quadro dele dá vontade de simplesmente vesti-lo. Porém, eu tive o pudor de fazer diferente. Então não reproduzi a obra dele nas roupas, minha inspiração partiu dos cadernos de estudo de seus desenhos. O filho dele, João Cândido Portinari, me apoiou em tudo que precisei, liberou o uso das imagens e me deu acesso a toda sua obra.

No ano passado, quando o estilista Pedro Lourenço conseguiu aprovação para captar recursos pela Lei Rouanet para um desfile em Paris, levantou-se novamente a discussão sobre se a moda é arte. O que o senhor pensa sobre isso? Estamos anos atrasados nesse sentido. Em muitos países a moda já é entendida como cultura. Ela faz parte dos novos vetores de cultura, como a arquitetura, a gastronomia e o design gráfico. Eu fico por entender aquela controvérsia. Acho pertinente o momento atual, que joga luz na obra da Zuzu Angel. Ela conseguiu com a moda muitas coisas que os intelectuais não conseguiram na ditadura. Existe uma ignorância e um preconceito contra o setor. É um vetor que emprega? Sim, como todos os da cultura. Que movimenta dinheiro? Sim, como o cinema. Mas é sem dúvida um vetor cultural. Muito da memória e da cultura de um país é entendida pela forma como as pessoas moram, comem e vestem em determinada época.  

Acredita que o preconceito com a moda brasileira pode estar ligado a atual crise na indústria têxtil? A cultura de moda no Brasil está adolescendo. Já temos uma identidade de moda. O estrangeiro bate o olho na nossa roupa e sabe que é brasileira. Vivemos tempos adversos, nossa indústria têxtil padece com concorrência desleal que vem de fora, mas somos resistentes, somos otimistas só de raiva (risos).

Como tem encarado a crise? É uma crise muito triste, perdemos grandes tecelagens, uma geração de empregos, de renda, de retorno econômico. E perdemos parte da cultura brasileira. No século XX, o Brasil tinha o poder da indústria têxtil, perder isso foi um pecado. Mas também é um setor que não tem articulação política alguma, estamos aprendendo.

Sua produção é toda feita no Brasil? Faço tudo no Brasil. Minha estrutura é pequena. Já foi maior, mas tive que diminuir justamente para sobreviver. No Brasil, ou você é pequeno ou gigante. Quando comecei a fazer coleção infantil, por exemplo, tive que escolher entre ela e a masculina. Por isso, hoje, o masculino é um coadjuvante na loja, mas não vai mais para desfiles.

Sua marca fala muito de brasilidade, com estampas e cores fortes, inspirações nacionais. Acha que seu diferencial é o que sustenta a Ronaldo Fraga? Nunca me achei ‘A’ diferença, só tem uma coisa que me move, que se eu não fosse estilista eu continuaria a perseguir: meu amor pela cultura brasileira. O primeiro contato que eu tive com a moda foi lendo. Eu lia muita literatura política e, em um livro do Zuenir Ventura, li sobre a Zuzu Angel. Uma figura marcante na moda e na política. Nunca pensei que com a moda você pudesse falar outras coisas que não fosse a roupa, a estação. Por isso, minha cartilha sempre foi essa, fazer a moda como um vetor cultural.

Muitos estilistas fazem parcerias com lojas de fast fashion, mas você geralmente se associa a marcas de outros produtos, como sapatos, chinelos, óculos, papel higiênico. Por que essa escolha? Eu digo que a moda está louca para se libertar da roupa. E ela faz isso quando estabelece diálogo com outras frentes. Colocar seu estilo ao serviço da indústria é fascinante. Essas parcerias colocam a moda no lugar dela, que é a contemporaneidade, o cotidiano. Agora fiz uma parceria com uma marca de cosméticos masculina francesa. Por enquanto ainda não posso dar mais detalhes.

No ano passado, seu desfile com modelos usando cabelo com palha de aço causou controvérsia. Como o senhor responde a isso hoje? Para mim, essa história evidenciou o preconceito que o brasileiro tem quando o assunto é moda. O tema do meu desfile era o futebol dos anos 1920 e 1930, em nenhum momento falei que era algo relacionado aos negros. Se aquilo estivesse no teatro, em uma mostra de arte ou no cinema teria passado batido. Mas na moda não. Na moda não pode fazer esse tipo de coisa. Em terra de míopes, o caso vira o que virou.

terça-feira, 18 de março de 2014

Artesãos brasileiros transformam peças de bike em bijuterias

Todo o trabalho é artesanal feito com a técnica de upcycle.
Peças velhas de bicicletas podem ser reaproveitadas e transformadas. Essa é a missão dos artesãos catarinenses Léo Begin e Raphael Fagiolo, sócios na Rust Miner. O trabalho da dupla consiste em transformar sucatas em bijuterias.
A inspiração surgiu pela necessidade. Os artesãos procuravam por acessórios masculinos com um estilo rústico e artesanal. Como encontrar as peças procuradas não era uma tarefa fácil, eles começaram a fabricar seus próprios colares e pulseiras. As criações fizeram sucesso e viraram negócio.
O nome da empresa vem do inglês e Rust Miner significa garimpeiro de sucatas, escolha que caracteriza perfeitamente a função de Begin e Fagiolo. Uma das principais coleções é chamada de Bike Lovers e a matéria-prima para esses artigos é sempre proveniente de peças velhas de bicicletas.

Nas mãos dos artistas, correntes e câmaras de ar viram pingentes, colares e pulseiras. Algumas peças ganham novas cores e formas totalmente diferentes, como é o caso das câmaras, cortadas à mão ou laser e montadas sempre manualmente.
“[Esta] é uma forma estilosa, inusitada e sustentável de levar o amor pelas magrelas onde quer que vá, principalmente naqueles momentos em q não se está pedalando”, explica Léo Begin.
Todo o trabalho é artesanal feito com a técnica de upcycle, que consiste em reaproveitar materiais em sua forma original, e não destruí-lo para fazer algo novo, como acontece com a reciclagem.
Além das peças de bicicleta, os artesãos também utilizam partes de relógios e outros materiais encontrados em ferros-velhos.  
Por Thaís Teisen - Redação CicloVivo

Dinamarca com Bahia: Leila Boavista estudou moda na Europa e cria acessórios sustentáveis

Ela vende as peças em lojas de Paris, Copenhague e Helsinki. Em Salvador, enquanto o site não fica pronto, dá para encomendar por e-mail


Um mês após se formar em Direito, a baiana Leila Boavista foi a Londres fazer cursos de moda. Trabalhou com  Vivienne Westwood e criou acessórios para grifes como  Chanel, Valentino e Prada. Depois, fez pós-graduação em moda sustentável, na Copenhagen School of Design and Technology, na Dinamarca. Seu trabalho de conclusão de curso, a linha de acessórios BOAVISTA,  recebeu nota máxima e representou a escola no Designers Nest, competição de moda da Escandinávia. 

Os colares, pulseiras e tiaras são feitos à mão, de acordo com a filosofia slow fashion. 
A estética tribal e viking vem da inspiração em deusas, guerreiras e orixás. Ela vende as peças em lojas de Paris, Copenhague e Helsinki. Em Salvador, enquanto o site não fica pronto, dá para encomendar por e-mail (boavista.leila@gmail.com) ou, na terça e na quarta, ir ao bazar da designer, das 14h às 19h, no Cristal Coiffer, que fica no Shopping Cidade (Itaigara). 
A designer de acessórios Leila Boavista:
a baiana trabalhou para Vivienne Westwood, Prada e Missoni

Você é formada em direito. Como a moda surgiu em sua vida?
Não trabalho com direito, mas o direito me trouxe ética e a fundamentação para o meu “approach” com a moda - por isso, trabalho com moda sustentável, que é uma moda mais responsável. Ela engloba não só as tendências da moda, como também os direitos dos trabalhadores e a proteção ao meio ambiente. A moda sempre foi muito forte em minha vida. Desde criança, gostava de cortar roupas, dobrar diferente, me produzir, tocar em tecidos e misturar estampas. Mas foi quando eu me mudei para Londres, em 2000, que ficou muito claro que era moda mesmo o que eu queria fazer. Lá comecei a estudar e trabalhar como produtora de moda. Em 2009 entrei na Copenhagen School of Design and Technology, em Copenhague, na Dinamarca. Em 2013 conclui o curso de pós graduação em moda sustentável com a nota máxima e fui indicada para participar de uma competição de moda da Escandinávia representando a minha escola. Estudar design na Dinamarca é como aprender futebol no Brasil…melhor lugar não existe! 
 
Quais são os acessórios que você produz?
No momento, produzo colares, pulseiras e acessórios para o cabelo, desde de tiaras casuais até para casamento. Mas em breve estarei também lançando outros tipos de acessórios como bolsas e cintos. 
 
Que materiais utiliza? Quais os diferenciais deles? Onde eles podem ser encontrados em Salvador?
A maioria dos materiais são naturais, como o algodão e a seda, mas trabalho também com o poliéster - que é ótimo em termos de ecologia. Os produtos acabaram de chegar ao Brasil. Já vendo em lojinhas exclusivas de Paris, Copenhague e Helsinki - em Salvador, por enquanto,  as vendas estão sendo feitas diretamente por mim - por e-mail (boavista.leila@gmail.com) ou telefone (8751-2218), até a minha loja virtual ficar pronta. Farei um Bazar de Carnaval na terça e na quarta-feira, das 14h às 19h, na Cristal Coiffer, que fica no Shopping Cidade (Itaigara). Haverá peças da coleção atual, “The Bird Collecton”, que  foi inspirada em pássaros e também uma linha mais sofisticada, feita em seda, inspirada em Orixás. Já tenho pedidos de lojas Copenhagen para o verão de lá. Vou passar o Carnaval trabalhando.
 
O que tem de inovador em seu trabalho?
Meu trabalho teve muito êxito na Europa justamente por levar para acessórios materiais geralmente usados em roupas. Meus acessórios foram definidos como contemporâneos justamente porque quase não uso metal - material comum na manufatura de acessórios. Além disso, eu mesma produzo a estampa e o look gráfico da peça apenas com a utilização da linha e combinação de cores. Tudo é feito à mão, como uma mini obra de arte. Isso permite que a peça seja realmente única e exclusiva. Integrei o design social e o slow fashion (“moda devagar”, e livre-tradução para o português), que normalmente são associados a produtos feitos de materiais reciclados, a uma estética de luxo.
 
O que significa slow fashion? De que maneira isso está ligado ao seu trabalho?
O slow fashion é um movimento que nasceu na Europa, em contraponto ao fast fashion. É inspirado no slow food (o inverso do fast food. É uma moda de qualidade, tanto no sentido estético quanto na manufatura - o slow fashion é produzido em pequena escala e oferece soluções sustentáveis na produção e consumo de moda. É um movimento que vai contra a produção exagerada e massiva da moda, que gera muito desperdício e tem uma mão de obra mais barata. Ao invés disso, o slow fashion é uma moda mais “devagar”, feita sem a pressa da indústria, que tem que seguir calendários e agendas. O slow fashion valoriza o trabalho manual, a perfeição, a história do produto e o seu valor ético, porque tem como requisito a produção local, gerando assim uma economia regional mais forte. Isso é a alma da minha moda, pois procuro fazer um design que vai além das tendências, produzo localmente e tenho a intenção de oferecer à cliente uma maneira de consumir melhor, com mais consciência do impacto das compras. Penso globalmente e por isso participarei de feiras de moda sustentável em Berlim, Barcelona e Copenhage este ano. Contudo, produzo localmente, utilizo fornecedores e mão de obra daqui de Salvador, tentando assim fortalecer a economia local. Meus produtos levam horas para serem feitos. Uma tiara pode demorar de 6 a 8 horas para ser manufaturada. O slow fashion me permite ter um relacionamento mais íntimo com o meu produto, já que não me limito ao processo de design mas atuo diretamente também na produção e execução das peças.
 
De onde vem a inspiração para fazer os acessórios? E as coleções?
Tudo me inspira, tenho uma cabeça cheia de estorinhas. Tenho uma estética tribal, mas com linguagem mais fashion e me inspiro muito em deusas, guerreiras, vikings... Nada de princesas! (risos) Em termos de cores, tudo pode me inspirar, de signos até pássaros tropicais. Absolutamente tudo. As coleções são feitas duas vezes ao ano - uma para o verão e outra para o inverno. Já fiz coleção inspirada no período Renascentista, devido aos seis meses morando em Florença (na Itália). A mais nova foi inspirada em pássaros tropicais - ou seja, tudo pode acontecer! 
 
Como foi a sua estada na Europa?
Morei 13 anos na Europa e estou em fase de transição - ainda moro lá e aqui. Por causa da expansão da BOAVISTA, pretendo ficar mais tempo aqui, produzindo, e só ir para a Europa a trabalho. Antes era ao contrário, morava lá e trabalhava aqui - mas o projeto está crescendo e requer que eu fique mais tempo aqui. O que me levou à Europa foi a história e a vontade de explorar um pouquinho o mundo, estudar moda e conhecer outras culturas. Essa viagem me deu tudo o que eu sou hoje, crescimento pessoal e profissional, estudo, muitas viagens, oportunidades de trabalho e lições de vida. Em termos de trabalho, foi ótimo pois trabalhei com grandes marcas com a Missoni, Vivienne Westwood, Prada... Participei dos principais eventos de moda da Europa, como Paris Fashion Week, London Fashion Week e Milan Fashion Week. A única coisa difícil que encarei lá foi a saudade da família e do Brasil.
 
Como foram os trabalhos com Vivienne Westwood e na EBI?
Trabalhar com Vivienne Westwood foi como realizar um sonho! Trabalhei com ela e o time dela em Londres e em Paris. Foi no estúdio dela que realmente percebi como é importante ter uma atitude sustentável e responsável perante a produção de moda. Vivienne, que é ativista do Greenpeace, estava todo o tempo lá, doutrinando a gente. O padrão de qualidade era muito alto e eu aprendi muitíssimo nos 6 meses que passei lá. Trabalhei no setor de Haute Couture, como assistente, e tudo era feito com muita precisão e perfeição. Vivienne é exigente. Assim que cheguei lá, ela me disse: “Aqui, somente a perfeição é permitida”. Foi trabalhando lá que eu aprimorei a minha paixão por produtos de alta qualidade. Mas foi no estúdio da EBI, em Florença, na Itália, que reforcei meu amor pelos trabalhos manuais. Passei seis meses fazendo bolsas de luxo e todos os tipos de trabalhos manuais para Prada, Miu Miu, Chanel, Valentino e Jimmy Choo. Paciência, foco e perfeccionismo eram centrais no meu trabalho. E isso eu trouxe comigo. Aprendi muitas técnicas manuais e trabalhei com profissionais excelentes. Foi uma experiência fantástica! 

Há semelhanças entre o design escandinavo e o brasileiro? O que um pode melhorar com o outro?
Não vejo semelhança. São designs completamente diferentes. Aqui gostamos de nos expressar com cores, somos extrovertidos. O próprio clima propicia decotes e mostrar mais o corpo. Eles são mais sombrios, discretos e se cobrem mais devido ao frio. O escandinavo se concentra em simplicidade e função. A gente, em estética. Eles podem aprender a ser mais coloridos e divertidos e nós podemos aprender a ser mais minimalistas e práticos. Acho que foi justamente por isso que estou tendo êxito em Copenhague. As mulheres estão tendo acesso a produtos coloridos e divertidos, sem perder a simplicidade.  
 
Além dos femininos, faz também acessórios masculinos ou unissex? 
Não. O meu universo é profundamente feminino, me inspiro em deusas, mulheres guerreiras. Mas já tem homem usando minhas tiaras. 
 
Você é irmã do cantor Manno Góes. Todos em sua família trabalham com arte?
Minha mãe estudou artes plásticas e meu pai sempre escreveu poesias. Minha avó paterna tocava piano e minha avó materna costurava. Manno compunha e tocava. Na minha casa, a estética sempre teve importância, seja na literatura, na música ou nas artes visuais. Na faculdade de direito, eu me destacava mais pelos looks do que pelas notas. Tinha cabelo vermelho e usava muita roupa em preto e branco. Tive um professor que me dizia: “Leila, você está na faculdade errada!”. Tanto que terminei a faculdade e um mês depois já estava em Londres, fazendo cursos de moda.

Ser Sustentável está na moda?

Por Roberta Valença*
Como todo  mercado, a indústria têxtil e de confecção, vitais para o consumo da moda, também tem se enxergado num contexto mais sustentável, mesmo que ainda por uma questão legal.

Temos acompanhado vários casos midiáticos como o da Nike, Zara,  lojas Emme etc., que caíram na armadilha da mão de obra barata, em países como Coréia do Sul, Taiwan, Hong Kong, Indonésia, Índia e Paquistão, e que pagaram um preço alto por não dar a devida atenção a uma “simples” terceirização de serviços.

A Globalização tem sido peça chave na reformulação de aspectos como reestruturação da cadeia produtiva e reorganização do processo produtivo, onde a terceirização de um serviço é vista como componente de fiscalização e controle. A China, que hoje é líder mundial no mercado têxtil e de confecção, tem como questão primária a adaptação às novas leis que regem o mercado no tocante de meio ambiente e trabalhista.

O Uniethos lançou recentemente uma pesquisa no setor, onde avalia a Sustentabilidade e Competitividade na Cadeia da Moda (Estudo completo no site: uniethos.org.br).  Constatou-se que hoje, o que diferencia os grandes players no mercado é a abordagem estratégica. A Sustentabilidade e Inovação são estratégias centrais da Indústria Têxtil europeia, por exemplo, enquanto na China o foco é o aumento de produtividade e qualidade.

Neste interim, o Brasil tem o desafio de elaborar novas estratégias de negócios, novos padrões tecnológicos, modernizar pequenas empresas e, principalmente, contar com políticas mais efetivas de inovação e qualidade de mão de obra.

A pesquisa revela também que o Brasil é um dos maiores produtores têxteis e de confecção do mundo, sendo o 5º no segmento têxtil e o 4º no de confecção, cuja produção média é de 9,8 bilhões de peças de vestuário, cama, mesa e banho. No entanto, o grande gargalo ainda é representar um volume maior de exportações. Segundo o Iemi (Instituto de Estudos e Marketing Industrial), o Brasil está na 23ª  posição dentre os maiores exportadores têxteis e na 80ª posição, dentre os maiores exportadores de vestuário. Para se ter uma capacidade competitiva internacional, será preciso extrapolar a questão da sustentabilidade no modelo de negócio existente.

Hoje, cada vez mais, há uma necessidade de se olhar para todas as áreas da empresa e analisar de um ponto de vista integral o que trará ganhos significativos verdadeiramente. Será que é reduzindo custos em mão de obra barata e para isso se utilizar de trabalho escravo/ infantil ou atuar na pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias mais limpas e realmente mais eficientes? Um processo de tintura de tecido que utiliza 80% menos água, cobre a diferença de se terceirizar trabalho infantil, por exemplo? As empresas devem e precisam começar a fazer esses questionamentos.

Do ponto de vista da sustentabilidade, cada vez mais, as empresas serão responsáveis pela cadeia produtiva onde estão inseridas e juntamente com isso, cresce a necessidade de saber exatamente onde, quando e como cada operação se realiza. Hoje, já temos muitas empresas que dão uma atenção especial a esse ponto, principalmente em relação à terceirização de serviços, desde a colheita do algodão que envolve uso de pesticidas e fertilizantes, água, condições degradantes de trabalho rural, geração de resíduos tóxicos e emissões de CO2, até a utilização pelo consumidor. E, olhar de forma sistêmica e sustentável todo esse processo, pode gerar novas possibilidades de se fazer as mesmas coisas de forma mais eficaz. O desenvolvimento da cadeia de fornecedores é um fator crítico para a participação no comércio global.

Para além disso, temos várias frentes e que andam em diferentes passos, mas a soma tende a seguir o caminho da sustentabilidade. Os estilistas, por exemplo, atuam em outra ponta, buscando novos materiais e apostando em reaproveitamento de tecidos, há muita coisa boa, como o biomimetismo – estudo e imitação das melhores ideias da natureza para ajudar a resolver os desafios humanos: a ciência inspirada na natureza que costuma inspirar muito no design de artigos da moda.

De outro lado, mudanças no comportamento do consumidor também auxiliam nessa demanda, por meio da exposição de opiniões em mídias sociais, apoiando o consumo consciente. A crescente venda pela internet - o ecommerce -, também surge como um exemplo de ideias estimuladas pelo consumidor na busca de novas formas de consumir, de qualificar e mudar a relação com o produto.

O que podemos enxergar nisso tudo é que há uma tendência de que o pensamento sistêmico com vistas a sustentabilidade se torne parte integrante de todo e qualquer processo no mundo da moda. Quem disser que ser sustentável não está na moda, literalmente não está na moda também...

*Roberta Valença é CEO da Arator, companhia especializada em projetos completos de sustentabilidade com inovação.